PASCOA VENHAM CELEBRAR A VIDA

PÁSCOA: VENHAM CELEBRAR A VIDA

Vivemos um tempo de quaresma quase permanente. Não é nem preciso ligar os canais de televisão, radio ou internet. Nem é preciso conectar mídias sociais. Bastar colocar a cara na janela e olhar para a rua. Noutro dia, numa celebração ordinária, num dia de semana, celebramos a dor de uma mãe que sepultara um filho de 7 anos, morto ao atravessar a rua, outra de um filho de 23 anos, morto na noite, entre perseguições, tráficos e violência. Ele não estava nem indo e nem voltando do trabalho; não ficamos sabendo o que ele fazia na rua no meio da madrugada. Vivemos numa quaresma permanente; com notícias incessante de corrupção e impostos sem medidas e seus protagonistas encenando ares de bons mocinhos. Nem percebemos que o traje dos bandidos modernos é o terno e as togas. Vivemos numa quaresma permanente. Vestimos roxo sem cessar e andamos envergonhados, tentando alimentar um fio de esperança.  

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Convidamos para celebrar a Páscoa, a vida plena, a vitória da justiça sobre o pecado, a esperança sobre o medo e a alegria sobre a tristeza. A Páscoa que é a vida em plenitude, não é uma realidade abstrata. Está em pequenas manifestações da vitória de Cristo sobre a morte. Encontramos pequenos acenos nas boas notícias, como no sorriso de Francisco, na caridade dos vicentinos, na missão dos devotos da Mãe de Deus, na graça da dedicação dos filhos espirituais de Anibal de Francia.

A vida plena está espalhada nas comunidades que se reúnem para rezar, nos jovens que se encontram para dançar sem drogas, da Missão Paz. Talvez os itens da quaresma social são mais conhecidos do que os itens da páscoa, citados acima. Ocorre apenas que o sono tranquilo não faz reportagem, reportagens são feitas apenas com pesadelos. É uma falha humana. Vamos entender a Páscoa, aquela dos hebreus, aquela de Jesus e a nossa Páscoa cristã.

 

MISTÉRIO MARAVILHOSO

A Igreja nos ensina que “a obra da Redenção humana e da perfeita glorificação de Deus, da qual foram prelúdio as maravilhas divinas operadas no povo do Antigo Testamento, completou-a Cristo Senhor, principalmente pelo seu mistério pascal… Cristo morrendo, destruiu a nossa morte e ressuscitando, recuperou a nossa vida.” (SC 5). De fato, o Mistério Pascal é a alma de nossa liturgia. Todos os mistérios de nossa liturgia são emanações deste grande evento e encontram nele sua raiz fundamental. São as palavras de Paulo que nos ensinam que sem a ressurreição de Jesus não tem sentido nossa religião. Nem sempre somos atentos a esta verdade fundamental e nos perdemos em devoções, fantasias, vestimentas e simbolismos que nos distanciam do coração deste convite divino para o mistério pascal. Todas as devoções, santorais, rituais, vestes e vasos sagrados devem nos elevar para Cristo, única verdade de nossa profissão de fé.

Em verdade, o Concílio Vaticano II nos convoca para resgatar o significado no mistério pascal, recuperando seu valor diante da piedade cristã, superando as inclinações devocionais, que algumas vezes se tornaram excessivas no quadro litúrgico católico.

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O mistério Pascal, que tem seu ápice na celebração do Tríduo Pascal, é a disposição divina de se reconciliar com a humanidade e conduzi-la à plenitude da salvação. Neste mistério tocamos o sofrimento de Jesus Cristo, sua morte e participamos de sua ressurreição. Este mistério é vivido nos sacramentos e, muito particularmente, no batismo e na eucaristia, que são os momentos mais elevados da celebração cristã.

Quando apresenta os objetivos da liturgia cristã, a Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium define o mistério pascal como a disposição de Deus em reconciliar-se com a humanidade e conduzi-la à plenitude do culto divino. Deus quer salvar toda a humanidade, portanto o mistério pascal é um convite à conversão. É um convite divino para a salvação de todos os povos. Foi um convite divino: “Deus, que quer salvar e fazer chegar ao conhecimento da verdade todos os homens’ (1 Tm 2,4), ‘havendo outrora falado muitas vezes e de muitos modos aos pais pelos profetas’ (Hb 1,1)…” (SC 5). Cada criatura humana é vocacionada para entrar no coração de Deus e participar de seu mistério e acolher a salvação. Nestes dias somos convidados para viver o mistério pascal participando das tristezas de Cristo e sentirmos em nossa vida a graça da ressurreição.

 

A GRAÇA PASCAL NA TRADIÇÃO BÍBLIA

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Deus convocou um povo para fazer Aliança consigo. É o povo hebreu, o povo das páginas bíblicas, que vive os sinais da ação de Deus na história. Deus revela muitos sinais que o povo acolhe e pratica seus ensinamentos. Antes de tudo, Deus convidou o povo, mas a aliança foi possível porque o povo acolheu o convite divino.

Deus convida e deixa o povo livre para assumir a missão.

 

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EVENTOS PASCAIS DO POVO BÍBLICO

Podemos ver alguns momentos da ação divina na história do povo revelados na Bíblia. Vamos recordar:

A Páscoa na criação divina: No paraíso, Deus cria o ser humano e ele é convidado para ser feliz. É o primeiro convite para a vida, quando toda criação é animada pela vida divina.

Deus convida, mas deixa livre o ser humano para seguir seus passos. Foi assim que o ser humano abandonou o caminho de Deus. Nossos primeiros pais pecaram e toda a humanidade ficou distante da graça. Deus vem ao encontro do ser humano e acolhe seu arrependimento e seu sofrimento. Ele nunca abandona seus filhos e espera sua volta, que se dá em tantos patriarcas e profetas. Deus espera o povo voltar de coração aberto, mas tem paciência e aguarda sua volta. Foi o primeiro gesto pascal de Deus, a primeira passagem do pecado para a vida.

Vocação pascal de Noé: O povo segue seu caminho e vai construindo sua história. Foi assim que testemunhamos mais um quadro da páscoa bíblica, simbolizado numa arca, que podemos denominar de arca pascal. Deus nota que o povo está distante da verdade, marcado pelos pecados e distante dos ensinamentos bíblicos. Deus manda construir uma arca, onde todos os convertidos pudessem entrar e viver a fraternidade e a paz. A Arca de Noé representa o povo que aceitou o convite divino para viver a vocação à fraternidade.

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É um aceno pascal maravilhoso, onde o povo é convidado a abandonar o caminho da corrupção e da maldade para viver a solidariedade e a partilha. Deus acolhe a conversão do povo com sua promessa alvissareira: “Nunca mais amaldiçoarei o solo por causa do homem. Sem dúvida, o coração do homem se inclina para o mal desde a sua juventude, porém nunca mais flagelarei todos os viventes como fiz. Enquanto a terra durar, sementeiras e colheitas, – frio e calor, verão e inverno, dia e noite – jamais cessarão.” (Gn 8, 21-22). A conversão do povo garante a plenitude da vida e a certeza da prosperidade, com a benção divina.

Formação de um povo pascal: O terceiro aceno pascal acontece na história do grande patriarca, Abraão, que acredita em Deus e convida o povo para uma passagem corajosa e inédita. O povo estava espalhado pelo deserto, vivendo como nômade em localidades distantes. O povo está disperso e desprotegido no meio do deserto e Deus convida Abraão para unificar as famílias num único povo e viver a Aliança e viver um projeto de vida, junto a Deus e seguindo seus ensinamentos. Este é o mistério pascal que congrega o povo. As famílias são convidadas para abandonar seu ostracismo e entrar num projeto verdadeiro de unidade. O convite a Abraão é um acontecimento pascal importante. O convite é divino, como se descreve: “Eu farei de ti uma grande nação e te abençoarei. Tornarei grande o teu nome. Tu sejas uma benção. Eu abençoarei os que te abençoarem, e quem te injuriar, eu o amaldiçoarei: em ti serão abençoadas todas as famílias da terra.” (Gn 12,2-3)

O povo é convidado para viver a Aliança e aceita participar deste projeto divino. É um projeto pascal, onde as famílias viviam no isolamento e buscam viver como um povo eleito e disposto a seguir os propósitos dos mandamentos divinos. Todos os povos da terra são convocados para viver como família de Deus. É mais um passo do mistério pascal.

 

A GRANDE PÁSCOA DOS OPRIMIDOS

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No Êxodo, o povo de Deus é convidado para mais um caminho pascal, a passagem da escravidão, no Egito, para a terra da liberdade, em Caná da Galileia (Ex 19; Nm 9). O povo vivia na opressão e sofria o domínio de poderosos faraós.

Deus intervém de forma direta suscitando Moisés para libertá-lo e o acompanha até a entrada na Terra Prometida. Esta é a Páscoa por excelência, anunciada pelos profetas e patriarcas. Entendemos que é a Páscoa mais importante de um povo que vivia na opressão e se libertou, pela força da fé e pela sua convicção, pois Deus nos quer livres.

Páscoa é passagem. Nas origens era a passagem dos velhos para os novos pastos renovados. Vida nova para os animais e para os pastores.

Páscoa é vencer a dominação dos poderosos e entrar na terra prometida de novas realidades. Só é páscoa se houver uma superação da dominação para a fraternidade.

Todos os passos de superação é caminho pascal. E o mistério pascal é a força divina que nos fortalece o espírito para termos coragem de vencer os males e viver novo tempo. Desde sempre o cristianismo se serviu desta tipologia para vivenciar a nossa Páscoa. A páscoa judaica é a iluminação da páscoa cristã. A Páscoa é um caminho aberto.

Novas passagens judaicas. Sempre os povos lutam por sua libertação, por mais vida e por mais liberdade. Lutou pela libertação para se livrar da dominação de Nabucodonosor, da Babilônia, de Antíoco IV, dos gregos e dos romanos. A páscoa é um estado perene de luta por libertação, por passagens da dor para a alegria.

Finalmente, entendemos que todos os povos querem construir sua páscoa, sua caminhada para novos tempos e novas esperanças. Os povos africanos, os povos indígenas, os povos pobres e abandonados procuram a Páscoa de suas vidas. E Deus, que nos ensina que somos irmãos, nos indica caminhos.

 

CONVITE PARA A PÁSCOA DE JESUS CRISTO

A Páscoa de Jesus Cristo é o centro da pascoa de todos os povos, pois seu projeto é universal. Não pensa na libertação de um povo, que para se libertar oprime todos os vizinhos e derrota todos os povos.

Páscoa não é conquistar uma terra e expulsar seus nativos, como se fossem inimigos. A Páscoa de Jesus Cristo é a vitória sobre a morte e sobre todos os sinais de morte na própria vida e na vida dos irmãos.

Desde séculos e em todos os povos, Deus prepara seus corações para entender que a páscoa é importante e não podemos ser felizes à custa da dor alheia.

Páscoa é verdadeira se for universal, para todos os povos, sobretudo para os mais entristecidos e empobrecidos. Jesus é o centro de uma nova aliança de fraternidade. Não é parcial, reconciliatória entre Deus e, agora, não apenas de um povo eleito, mas com toda a humanidade.

Celebrando a fé cristã, em nossas comunidades, a Semana Santa vive os rituais da Páscoa cristã.

 

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SEMANA PASCAL DOS CRISTÃOS

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No início da Semana, celebramos a alegria da Procissão de Ramos. Uma celebração festiva, prenúncio da Páscoa, pois Jesus é acolhido pelo povo e toda multidão grita e aclama alegremente.

É a festa do povo que se sente oprimida por poderosos do templo e do palácio. O povo está contente e confiante, pois Jesus não chega num cavalo de guerra assustando e atropelando as mulheres e as crianças; ele vem num animal modesto e pequeno.

Era o animal dos campos e dos serviços domésticos. Seu jumentinho não é um animal para haras e para competições vaidosas, antes é um animal que mora no quintal e carrega água dos poços distantes e trigo das roças.

A Semana é intensa e maravilhosa. É a grande semana. Nesta semana que se santifica por nossas atitudes, por nossa oração e nossa partilha. Quando iniciamos o Tríduo Pascal, na noite de Quinta feira, com a Celebração de Lava-pés e da Ceia do Senhor, vivemos intensos momentos de religiosidade.

A celebração é carregada de símbolos maravilhosos, que nos coloca no coração do mistério pascal. 

Na Sexta feira da Paixão, quando celebramos os últimos dias da trajetória de Cristo na terra, a Via Sacra nos ensina a compartilhar as dores de Cristo e a solidariedade de Verônica, de Cirineu, de Arimatéia e sobretudo de Maria, a mãe.

As longas horas entristecidas, não por masoquismo, mas por sobriedade, nos coloca perto dos pobres e abandonados; das mães solitárias, dos idosos esquecidos e dos jovens sem esperança. As longas horas do sepulcro de Jesus é um espaço de conscientização e meditação. Jesus está no sepulcro e nós estamos em luto. Luto que nos faz lutar.

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A obra pascal de Jesus é o caminho de superação de tantos entraves da vida. É uma obra divina. “Esta obra da Redenção humana e da perfeita glorificação de Deus, da qual foram prelúdio as maravilhas divinas operadas no povo do Antigo Testamento, completou-a Cristo Senhor, principalmente pelo mistério pascal de Sua sagrada Paixão, Ressurreição dos mortos e gloriosa Ascensão.

Por este mistério, Cristo, ‘morrendo, destruiu a nossa morte e ressuscitando, recuperou a nossa vida’. Pois do lado de Cristo dormindo na cruz nasceu o admirável sacramento de toda a Igreja.” (SC 5)

Finalmente, a grande celebração da Vigília Pascal, a mãe de todas as vigílias. Na recapitulação da história da salvação, nas águas batismais, no fogo sagrado e na ceia pascal.

É tempo de Páscoa, tempo de libertação, que nasce dos caminhos da conversão. Somente a conversão do coração leva à conversão da vida, que leva à libertação. Libertação da violência e da corrupção e construção de um mundo de paz e justiça.

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Prof. João H. Hansen – Pe. Antônio S. Bogaz
Autores de “A praça da dádiva”. Lafonte. 2017
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PESSACH:
A FESTA ORIGINÁRIA DA CEIA CRISTÃ
A tradição judaica conhece duas ceias importantes que podem estar na origem da ceia cristã. Jesus, na sua ceia de despedida com os discípulos, conforme conhecemos pelos evangelhos, celebrava um ritual de partilha e de ação de graças, no tempo pascal.
A comunidade celebrava o Hallel, um modelo de ágape fraterno, como uma confraternização comunitária, celebrada em ocasiões importantes, como aniversários e acontecimentos importantes da vida. No entanto, acreditamos que a ceia eucarística tem sua origem na festa judaica do Pessach, celebrada no templo e nas famílias.
A Páscoa – pessach, é certamente a festa mais significativa. Sua celebração é no mês de Nisan, no seu décimo quarto dia. No hemisfério norte, a definição da data ocorre por ocasião da primeira lua cheia de primavera, estação do renascimento da natureza, depois de uma árduo tempo invernal. Nesta noite, os filhos dos hebreus libertaram-se da escravidão egípcia e, num dia longo, com temperatura suave, e numa noite “tão clara quanto o dia”, (Ex 12 ss) deixam para trás a terra da escravidão e, confiantes em Javé, Deus libertador, tendo à frente Moisés e Aarão, partem para a terra prometida.
Na celebração da Páscoa original, cada família ofertava um cordeiro, para recordar e reviver a noite memorável da libertação. O sangue do Cordeiro garantia a proteção de Javé, pois assinalava o compromisso da aliança e a vitória da justiça divina.
Inicialmente esta celebração era familiar, mas nos tempos de Jesus era já, uma festa – peregrinação ao templo de Jerusalém (Ex 12; Js 5, 10-12)

 


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