ITE, MISSA EST

ITE, MISSA EST

 A MISSA TERMINOU

Edmund Campion Missal (4)

Lembramos-nos de Mateus, quando lemos seu evangelho e encontramos as palavras exortativas: E, aproximando-se Jesus, falou aos discípulos dizendo: Foi-me dado todo o poder no céu e na terra. Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”.

Sua exortação continua incentivando seus seguidores para a missão, insistindo: “Ensine-os a guardar todos os mandamentos que vos tenho anunciado. Eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”.

Após nossa missa, aos domingos, dias santos ou mesmo durante a semana, quando voltamos para nossos lares, devemos sempre ter a grande preocupação de que assumimos o compromisso da evangelização.

Temos que seguir os passos dos apóstolos e ter coragem de  evangelizar. Para isso estivemos na santa missa, aprendendo e participando do que Cristo nos ensinou. Depois das maravilhas ouvidas e vividas na celebração eucarística, somos convidados a praticar as mensagens evangélicas.

 

ITE, MISSA EST: UM PROJETO DE VIDA 

Ite, missa est. Tradicional e clássica expressão. Sua filologia vem da língua litúrgica cristã, que simplesmente anuncia que a missão terminou.

Traduzida simplesmente como “a missa terminou”, se buscamos melhor sua origem mais precisa, descobrimos que sua forma literal quer dizer “Ide, (esta) é (a) dispensa”. Em termos mais coloquiais, lemos assim: “Vão, vocês estão dispensados”.

Utilizada por muitos séculos, esta expressão foi utilizada por séculos, sobretudo depois da Reforma de Trento, no século XVI. Na Idade Média, talvez por falta de compreensão do significado original da frase, a assembleia assimilou como sendo Ite, missa est  (finita), ou seja, “Vão, (a) Missa é (terminada)“.

Mais interessante é que a palavra para “dispensa” (missa) acabou se transformando no nome da celebração como um todo. Este é um dos nomes da celebração eucarística ao longo dos tempos. Em nossos dias, o Missal Romano traduz simplesmente como “Ide em paz”. 

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OS TERMOS DA CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA 

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Não é tão simples entender o significado dos conceitos referentes à ceia eucarística. No entanto, se entendemos estes termos, podemos compreender melhor a teologia da ceia eucarística. De fato, o termo “missa” é lembrado através de três etimologias de idiomas antigos.

Encontramos o termo no grego músis, que quer dizer iniciação, também do hebraico, onde encontramos missah, significando unção  (unctio) e finalmente do latim missa, que acabamos por traduzir como missão.

Acreditamos que a origem da palavra não pode ser originária do grego e nem do léxico hebraico. Isso por que o cristianismo tem sua origem no Oriente. Reconhecemos o fato que todas as palavras litúrgicas de origem grega ou hebraica são registradas na Liturgia ou na Literatura das Igrejas Orientais.

Originalmente as expressões são alcunhadas naquele espaço geográfico, sobretudo o Oriente Médio. Bem diferente é o que sucede com a palavra missa, que é privativa da Igreja Latina, quer seja, a Igreja ocidental. Por consequência, a palavra missa é exclusiva da Igreja Latina, onde podemos deduzir que vem mesmo do latim. Arriscamos duas hipóteses para sua origem e seu significado:

Primeiramente, podemos considerar o termo como a declinação feminina do adjetivo missus. Esta expressão quer dizer enviado. Seu substantivo, missa, tem o sentido de demissão, querendo dizer “o ato de despedir”. Podemos falar da criação de um neologismo como “despedimento”.

Em segunda hipótese, tomamos o adjetivo missa no sentido civil. Assim, não pode ser a origem do termo litúrgico, uma vez que nesse caso, precisaríamos ter um substantivo oculto, como vítima, por exemplo. Os estudiosos tentam esta hipótese, mas não acreditam na sua solução filológica. Assim, conclui-se que esse sentido é menos provável.

Discorrendo sobre estes termos, finalmente os linguísticas  e latinistas preferem a solução que aponta para a expressão como um substantivo comum, com indicação direta para a assembleia. Define-se então que se trata de um termo do latim clássico “missio”. Sua base é o verbo mittere. Trata-se de um comando, cujo significado mais evidente é a “ação de mandar embora.

A aproximação com o termo missa ocorreu por se relacionar com outras palavras latinas. Neste caso, aos poucos, deu-se a substituição da forma abstrata do termo “missio” por uma forma concreta, como um substantivo “missa”. É semelhante ao processo de evolução filológica, no qual os substantivos “promessa e remessa”  vieram, por corruptela” de termos anteriores “promissa e remissa”. Estes termos chegaram à expressão pós-tridentina que é a “missa”.

Finalmente, para atingirmos conclusões mais simplificadas e de entendimento popular, relacionamos a expressão missa, com suas incursões linguísticas, para explicar a origem da expressão clássica “Ite, missa est”. Recordamos que este conjunto breve de termos não indica toda a celebração, mas apenas uma parte – a finalização – do ofício divino. De fato, a mesma expressão que está no final da ceia eucarística, também é encontrado em outros rituais, como o sacramento da confissão e do batismo. É o ritual de despedida destes sacramentos e não indica a celebração do sacramento, nem mesmo a sua essência, mas apenas a sua finalização.

Temos que reconhecer que a expressão “Ite, missa est” já existia no latim, muito antes de passar para o uso clerical. Podemos citar alguns casos históricos, pois a mesma frase era usada, por exemplo, para encerrar as audiências dos tribunais de justiça. Citemos a obra Patres Latini, de  Avito de Viena, que recorda a presença da expressão na literatura civil: “Nas igrejas e nas cortes do imperador e do prefeito se diz “ite missa est” quando o povo é despedido da audiência.”

Voltando para o universo religioso, os seus historiadores afirmam que existiam duas situações onde a expressão é usada regularmente. Em primeiro lugar, na celebração das comunidades primitivas. Citamos Agostinho de Hipona  que nos diz que “depois do sermão se faz a missa (despedida) dos catecúmenos”.Na segunda hipótese, que permanece até nossos dias, o celebrante despede os fiéis. Aqui citamos a obra de Peregrinatio Sylviae, uma obra de Isidoro de Sevilha, quando “o sacerdote abençoa os fiéis e faz-se a missa, isto é, a despedida.” Esta é a expressão clássica assumida pela Igreja e que entrou no ritual da ceia eucarística até nossos dias.

MISSA E MISSÃO

Sem dúvida alguma, nenhum momento é mais santificador e mais completo na religiosidade de cada cristão que a Santa Missa. É a oração mais completa da Igreja, pois renova, de modo extraordinário, a presença de Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo na vida do fiel e na comunidade eclesial.

A Missa se concretiza, por exemplo, na comunidade congregada pelo Espírito Santo, na pessoa do sacerdote, na palavra, quer se cante, que se medite, bem como na consagração das espécies eucarísticas. A missa une a Igreja militante com a Igreja triunfante, unindo o mundo espiritual e o mundo concreto, a história do povo cristão. A ceia eucarística é o ritual supremo de nossa vivência cristã, colocando-nos em unidade com os irmãos e com suas vidas. Ainda mais, nos envia como missionários, para viver e praticar os ensinamentos de Cristo. A ceia dos apóstolos entre tantas e belas partes refletem o ensinamento de Cristo e a sua presença na história.

Na celebração da missa, o fundamental é celebrar o mistério pascal de Cristo. Sua essência não é oração por defuntos ou celebração de formaturas, aniversários e outros fins secundários. Toda celebração tem por objetivo fundamental viver a paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo, como forma de atualização em nossa vida cotidiana.

Falamos com muita ênfase da Primeira Eucaristia, para deixar claro de que se trata da primeira, sinalizando todas as outras que virão ao longo da vida, como o maior e mais profundo alimento da vida cristã, ofertada por Jesus Cristo a todos seus discípulos e fiéis.

A Missa continua a ser o prolongamento do nosso dia-a-dia. Depois de sua celebração litúrgica, os fiéis que participaram da Santa Missa, comungam e saem da celebração com a presença de Cristo em seu coração, pela Palavra, pelo amor, pelos irmãos da Comunidade, pela comunhão eucarística.

A devoção à Eucaristia tem vários direcionamentos dentro da fé. O primeiro, sem dúvida alguma, é da presença de Jesus Cristo na Eucaristia, na Sagrada Escritura, na vida da Comunidade e nas espécies consagradas.

Após o Concílio Vaticano II, houve uma revalorização da leitura da Bíblia nas celebrações, fazendo com que o fiel se aproximasse ainda mais dos ensinamentos de Cristo e de sua mensagem. Temos que valorizar a vocação dos nossos sacerdotes, que acabam nos conduzindo nesta jornada, tornando nossas vidas mais missionárias.

A Eucaristia tem o sentido único de nos envolver de tal forma na nossa fé, que tocamos o Cristo, que se faz presente na celebração.

Jesus nos doa sua vida e nossa felicidade nos prepara para a vida eterna. Vivemos na ceia eucarística a presença celestial de Jesus. 

A Missa tem tantos significados que por mais que possamos participar, nunca será o suficiente para entender todos os mistérios da nossa fé.

 

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Cristo nos deixou uma ordem: “fazei isto em memória de mim”. Isso significa nossa participação durante a celebração. Somos parte da memória conjunta em volta do Senhor. Por isso, participamos da ceia do pão e do vinho para complementar esta religiosidade, que nos envolve em todas as celebrações. Cada missa é como se fosse a primeira e a única, e a cada vez sentimos a vida divina de Cristo em nossas vidas.

Para participarmos da Missa, precisamos estar de acordo com os compromissos que Cristo nos ensinou. Comungar é participar de um ato profético do Filho de Deus, que nos oferece o pão partilhado e nos mostra como devemos ser justos com os nossos irmãos. Ele partilha o pão, estabelece as condições para vivermos uma vida mais santificada, pela solidariedade, fraternidade e paz. Na missa, celebramos e vivemos estes valores, que são intrínsecos à nossa fé. Celebrar a eucaristia é viver na graça divina.


CELEBRAR E VIVER A MISSA

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Cristo nos oferta seu corpo e seu sangue, torna-se nosso alimento espiritual, Ele é o corpo de Deus partilhado entre nós neste seu Reino, onde fazemos parte do pão da vida e do cálice da libertação.

Isso nos arranca de nosso individualismo, para participar conjuntamente com todos os irmãos da mesa da eucaristia para resgatar a dignidade humana. 

É um convite feito pelo próprio Jesus a cada um de nós, para que deixemos nos entreguemos totalmente na partilha com  o próximo.

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Na ceia eucaristia encontramos os elementos que através da palavra de Deus, não nos deixam de ser omissos com nossos irmãos. A Sagrada Escritura nos obriga a entrar na coerência da prática eucarística.

O Corpo e o Sangue de Cristo são para todos os filhos  de Deus. Juntos somos parte de seus membros formando um só corpo, o corpo místico de Cristo. Padres e leigos, todos juntos, para celebrar a Ceia do Senhor. É o momentos mais importantes da liturgia cristã, onde o próprio Jesus se revela para todos. É o mistério da transfiguração de Jesus que é chegado a todos aqueles que tem fé.

Com a celebração da Missa, assumimos o compromisso da partilha e da evangelização, onde o principal elemento é a nossa vida, que deve se tornar uma força transformadora da sociedade. Não podemos esquecer que aprendemos que a partilha do pão pela solidariedade com os mais pobres, nos faz igual a todos, quando unidos auxiliamos os irmãos menos favorecidos.

Após o término da missa, as palavras que o tempo levou, pois foram atualizadas, mas que permanecem sempre atual como Ite missa est, significa, também, entre tantos conceitos, que devemos sair da celebração e fazer como os apóstolos fizeram: evangelizar e praticar o bem. Nossa missa é o encontro com Deus e nossa missão é socializar esse maravilhoso encontro.

Quando terminamos a celebração, levamos Cristo no coração. Levamos também a esperança de reunir cada vez mais irmãos para abraçar a fé que nos une a Jesus Cristo. Ite, missa est.

 

 



Pe. Antônio S. Bogaz – Prof. João  H. Hansen

Autores: Novos tempos da celebração cristã: Paulus. 2015

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Conhecendo mais…

OS TÍTULOS HISTÓRICOS DA MISSA

Os principais títulos da “celebração eucarística” a partir das narrativas neo-testamentárias e da tradição cristã são:

  1. Ceia do Senhor (1Cor 11, 20-23): Este título reflete uma reunião de amigos, ao redor do Senhor, que compõe uma comunidade, reunida com o seu “líder espiritual” e com ele partilha os bens da mesa, como forma de comunhão entre os vários componentes da mesa.

  2. Fração do Pão (Lc 24, 35; At 2, 42.46; 20, 7; 27, 35): esta terminologia tem uma conotação de partilha e de convívio, dando uma conotação também social de partilha, incidindo sobretudo na visão de convívio comunitário, preocupando-se também com os ausentes. Esta visão da “celebração eucarística” é mais acentuadamente comensal e manifesta os valores da berakah celebrada pelos hebreus.”

  3. Ação de Graças: Para além dos textos bíblicos, Jesus dá graças ao Pai pelo pão e faz o mesmo com a taça de vinho. As duas espécies apresentadas na ceia comunitária representam os bens recebidos da gratuidade divina, pelos quais, em nome de todos, Jesus rende graças ao Pai.

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ITE MISSA EST 

Fecha o missal do amor e a bênção lança
À pia multidão
Dos teus sonhos de moço e de criança;
A bênção do perdão.
Soa a hora fatal, reza contrito
As palavras do rito:
Ite missa est.

Foi longo o sacrifício; o teu joelho
De curvar-se cansou;
E acaso sobre as folhas do Evangelho
A tua alma chorou.
Ninguém viu essas lágrimas (ai tantas!)
Cair nas folhas santas.
Ite missa est

De olhos fitos no céu rezaste o credo,
O credo do teu deus;
Oração que devia, ou tarde ou cedo,
Travar nos lábios teus.
Palavra que se esvai qual fumo escasso
E some-se no espaço.
Ite missa est.

Votaste ao céu, nas tuas mãos alçada,
A hóstia do perdão,
A vítima divina… e profanada
Que chamas coração.
Quase inteiras perdeste a alma e a vida
Na hóstia consumida.
Ite missa est.

Pobre servo do altar de um deus esquivo
É tarde; beija a cruz;
Na lâmpada em que ardia o fogo ativo,
Vê, já se extingue a luz.
Cubra-te agora o rosto macilento
O véu do esquecimento.
Ite missa est. 
Machado de Assis