CRONICA 24 12

PRESENTE DE NATAL

NÃO TENHO CARRO, MAS TENHO MÃE.

FOTO - bicicleta e mãe - 24 dez AJUS

Chegamos para a Cantata de Natal. As expectativas eram grandes para o espetáculo, mas o tempo insistia em chover sem fim. E chovia, sem parar. Com certa tristeza, não deveríamos fazer a cantata no espaço aberto, mas na cobertura da própria estação.

 A vibração das crianças era enorme e os país foram chegando com seus filhos. Mas a chuva insistia em ditar as normas de mais uma noite do Natal Luz.

 Uma das mães, a Marília acabou de chegar, com o Gabriel e outros, todos molhados.

 – Como vocês vieram, com toda esta chuva?

– Viemos de bicicleta, viemos embaixo da chuva.

– Porque vieram, não era preciso vir.

– Mas o Gabriel não quería perder jamais  esta Cantata. Ele quería cantar, de qualquer jeito.

– Que bom, que alegrIa. Isso nos dá muita honra.

 Alguém entrou na  conversa, assim, meio perdido, admirado com a mãe e o menino tão  encharcados.

– Como estão molhados. Não vieram de carro?

A mãe meio sem jeito, meio envergonhada, respondeu

– Viemos de bicicleta. Não tenho carro; tenho somente a bicicleta.

E o Gabriel completou:

– Não tenho carro, mas tenho minha mãe.

E a mãe, quase como um responsorio completou:

– E eu tenho um filho.

 Nestes dias natalinos, vemos as pessoas abrindo e trocando presentes, como se fossem pérolas. Estes presentes podem ser valiosos, mas não consiste nisso o Natal. Embrulhos, presentes e brinquedos podem não ser o Natal de Jesus, mas o mercado do Papai Noel.

Por certo, não devemos desprezar estes gestos tão bonitos, sobretudo se fizerem apenas parte de um processo comercial, incitado pelas propagandas.

 Nestes tempos de crise, onde parece que quase todo mundo está fazendo economia, temos muito que aprender. Todos os estudiosos acreditam que a crise é muito importante, pois serve para nos desacomodar e nos faz buscar novos caminhos.

  Quem sabe, com esta crise, cada um de nós possa perceber como vivemos de futilidades, como compramos tantas coisas desnecessárias, armazenamos roupas, calçados e perfumes e criamos mil necessidades, sem as quais viveríamos muito melhor.

Sempre acreditamos que o excesso de roupas, sapatos e luxos serve para acalmar as carencias pessoais e disfarçar nossos desejos não realizados. Afinal, se alguém precisa de tantos acessórios, por certo não está muito seguro daquilo que é essencial.

 Algumas vezes, parecemos a casa da árvore das crianças. Tudo que encontramos levamos para dentro de nós mesmos e nos tornamos pesados, exigentes e acoplamos necessidades “desnecessárias”. Numa obra magnífica (Quatro alqueires e uma vaca), Gustavo Corção, um intelectual do existencialismo cristão,  reflete que nos bastariam poucas coisas para viver, mas que somos bombardeados a cada instante e criamos infinitas necessidades, tornando-nos seres manipulados pelo consumismo, pela mídia e pelo comércio.

 E o mais grave de tudo isso e que enquanto esbanjamos com vaidades, grande parte da população não tem o básico para viver.

 Quando fala das necessidades  humanas, Jacques Maritain acusa que enquanto se gasta  tanto dinheiro com necesidades terciárias (de luxo, vaidade e esbajamento),  muitos não atingem suas necesidades secundárias (conforto e bem estar) e muitíssimos são desprovidos de necesidades primárias ou fundamentais (arroz e feijão, moradia, caderno escolar, remédio).  Tudo isso poderia ser fácilmente compreensível numa sociedade de pagãos e jamais numa sociedade de cristãos. Talvez não sejamos tão cristãos assim. Nosso Natal está mais para “Papai Noel”, o velhinho-propaganda do comercio, que para Jesus, o “garoto-propaganda” do amor e da partilha.

 É tempo de Natal e vale sempre a pergunta: o que tem tomado mais nosso tempo e nossos pensamentos: Jesus, a verdadeira paz e partilha,  ou Papai Noel, maquiado de bom velhinho para vender. Nossas atitudes revelam nosso espírito. Não, não pretendemos mudar a sociedade anônima, precisamos mudar nossos corações. Ainda é tempo; sempre é tempo.

Antônio Sagrado Bogaz – Prof. João Hansen