VELHOS TEMPOS, TEMPOS NOVOS
DIÁLOGO ENTRE GERAÇÕES
Ninguém se conformava. Mateus não parava de teclar em seu novo celular. O netinho, chega para o avô e conta que tem um novo brinquedinho. De fato, o avô estava muito curioso.
– Venha brincar, Matheus, tem tantos brinquedos na sala.
E o menino não levantava os olhos do seu aparelho. Apenas uma luz se desprendia e iluminava o rosto do menino.
Chegou uma visita, que cumprimentou o netinho.
– Oi Matheus, tudo bem com você? Como você cresceu.
E o menino, sem nem mesmo levantar os olhos do aparelho.
– Eu estou bem. Muito bem. Passei de ano.
– Levanta os olhos, Matheus, cumprimenta a Dona Valéria.
– Oi Dona Valéria. – e estendeu os braços, mas o olhar não escapou do aparelho. Seguia seu joguinho. Luciana, a mãe, intervém.
– Ele brinca o dia inteiro, o dia inteiro. – E tomou o celular das mãos do menino. Ficou meio irritado, mas se conformou, pois não tinha solução. Veio para o vovô e sentou-se em seu colo.
– No seu tempo não tinha celular?
– Não, era muito diferente.
– E o que vocês faziam o tempo inteiro, vovô?
O vovô sorriu e respondeu;
– A garotada toda brincava na rua, no parque. Tinha jogos interessantes. Arquinhos, bolinha de gude, pega-pega, cantigas de roda e saraus. A gente tinha até estilingue.
– Estilingue. Bem engraçado. Para que estilingue?
– Caçar passarinhos no bosque.
O menino nem respondeu. Mas se percebeu seu olhar denunciando repugnância.
A gente passava o tempo em brincadeiras com os amiguinhos. Fazendo traquinagens.
– Minha mãe não iria gostar. Ia me colocar num canto para refletir.
A conversa foi longe. Deu para perceber uma disputa de ideias e de gerações. A importância de brincar com os amigos, de tocar a terra e de subir em árvores e sentir o gosto das disputas dos jogos de força e de esperteza. Os argumentos dos meninos não foram piores, falando da comunicação imediata, das pesquisas para a escola, dos jogos gratuitos.
A velha geração atacou: a obsessão pela tecnologia, as mensagens repetitivas e ridículas do whatsapp, o excesso de individualismo, a troca permanente dos programas, o consumismo, o medo dos sites imorais.
A nova geração contra-atacou, mostrando que não se usa mais papel, que pode avisar para a mãe onde está, que pode trocar informações em segundos, que passa o tempo mais rápido sem se enjoar, que… que.. e que…
Terminou a conversa e o vovô ficou imaginando que o netinho nunca teria a alegria de receber uma carta escrita de uma namoradinha, que nunca sairia a caçar grilos na colina, que nunca correria atrás de vagalumes e tantas coisas românticas de seu tempo.
A imaginação do menino não se deu por vencida. Dizia para si mesmo:- Tenho pena do vovô, com os dedos sujos de nanquim, tendo que folhear livrões enormes e ficar com alergia, não poder falar com os amigos por meses. – Coitadinho do vovô.
Não se deram por vencido. Tratava-se de uma disputa entre gerações. Cada um deles se sentia embaixador de uma facção da humanidade: velhos e jovens. Um conflito sem fim, que mudam apenas os protagonistas, mas sobrevivem os ideais.
Não demorou muito e eis os dois novamente abraçados, para o nocaute final do conflito.
– Ah, há, – disparou o avô. Sem caneta, como você poderia escrever uma cartinha e colocar numa garrafa bem fechada e jogar no mar, para os habitantes do outro lado do oceano?
– A gente coloca o ship numa garrafa, ora essa. Ambos riram.
Tudo tem o seu tempo certo. Hoje estamos diante de vários mundos, o do avô, do pai e do neto. Não é fácil deslocar-se para cada um e todos viverem como se este tempo não existisse. No entanto, pode-se viver muito bem aceitando as diferenças. No tempo do vovô, o romantismo de receber uma carta de amor pelo correio, o do pai de enviar um e-mail distante para amigos, e do neto de abrir o zap e ver em tempo real todas as novidades. Certamente é um mundo mais fácil do que escrever em papiros, mas cada um tem seus encantos.
Antônio Sagrado Bogaz – Prof. João Hansen