ADVENTO E NATAL

ADVENTO E NATAL

CONVITE PARA A FESTA DO DIVINO

advento

O Advento se deslumbra diante de nossos olhos como uma grande festa, a festa de Deus. Ele vem ao mundo, como um convidado especial e nós somos convidados para esta grande solenidade. É a festança que congrega Deus, com seu amor e sua graça e toda a humanidade com sua indigência.

É uma festa que se prepara com amor, pois é um grande acontecimento. É certamente o momento mais solene na história da humanidade, pois jamais Deus viera pessoalmente a festa dos homens. Ele se veste de simplicidade e tendo na alma uma grande humildade, abre-se para acolher todo seu povo em sua vida, em seu coração sem fronteiras.

Para participar mais plenamente e se integrar mais profundamente nesta grande solenidade, que é o Natal do Menino Deus. Sem a devida preparação, não poderemos viver intensamente este encontro e não vamos saborear destes bens divinos.

Neste chamado para congratular-se com Deus, devemos estar bem preparados e confiantes, pois somente assim vamos aproveitar cada instante deste grande dia, transformando nossa existência e alimentando nossos corações para todos os dias de nossa vida.

 

ALEGRIA E LUZ EM NOSSA HISTÓRIA 

Este tempo bonito da vida litúrgica da Igreja que é a “manifestação do Senhor” é um itinerário que se concretiza em três momentos importantes, a serem vividos em sua plenitude. São três partes de um mesmo ciclo natalino.

Na primeira etapa, vivemos a preparação, que é o próprio Advento. Em seguida, celebramos o próprio mistério da encarnação do Verbo, rememorando o Nascimento do Filho de Deus e, finalmente, a sua manifestação pública, primeiramente na própria estrebaria e em seguida a todo universo, simbolizado nos três reis sábios, com suas etnias universais, representando todas as raças. Esta é a epifania do Menino Deus, sua exposição ao mundo inteiro. Sua epifania termina com o início de sua missão, assinalada pelo seu Batismo nas águas do Jordão.

Temos neste ciclo do Ano Litúrgico o encontro da divindade, representada pelo Espírito Santo, e a humanidade, concretizada por Maria. Este encontro maravilhoso e redentor se concretiza no Verbo Divino encarnado. De fato, realiza-se o grande mistério de Cristo em Maria. Eis a relação entre a encarnação divina, obra do Espírito Santo e a encarnação do Verbo, realizada a partir da humanidade de Maria.

Eis o novo sol, o “solis invictus”, aquele que jamais perece e segue radiante pelos séculos sem fim. Para melhor celebrar e viver este acontecimento, a religiosidade cristã busca o universo histórico-cultural que evoca a religiosidade pagã. Por ela, entendemos que Cristo é o novo sol. A luz sem ocaso. O cristianismo se apropria deste símbolo natural e cósmico do sol vencedor, para compreender o mistério do Sol divino que nasce no Natal. É o caminho para evangelizar, servindo-se de temas e símbolos, compreendido culturalmente pelos povos cristãos primitivos.

Simultaneamente, o ciclo natalino se identifica com o ciclo pascal. Advento é similar à quaresma, servindo como período preparatório. Páscoa é vitória sobre a morte, Natal é luz divina sobre as trevas humanas. Aos poucos a festa natalina foi ganhando força e o Natal se torna a maior festa popular e religiosa da cristandade. Similar ao mistério da Páscoa, as festas natalinas tornam-se as festas mais apreciadas pelos povos cristãos de todo o mundo.


CONVITE PARA A FESTA DO SOL 

Muitas vezes, lemos em contos infantis sobre a beleza do sol que acorda a manhã e espanta a  escuridão. Lemos na páginas das fábulas a festança dos pássaros e dos bichos da floresta, fazendo uma grande festa para ao sol. Sol representa novo dia, alegria e entusiasmo. Este encantamento com o sol é percebido entre os povos, com muita frequência. Os indígenas fazem a festa para o sol. Nas tribos indígenas da América do Sul, como os astecas, encontramos na montanha mais alta da colina um portal gigante de pedra, com uma abertura para acolher o sol pela manhã. Os fiéis indígenas se reuniam no vale e esperavam com preces e cantos o despertar do sol no horizonte. O portal era seu altar, onde ele se ofertava pela comunidade reunida. O sol é símbolo de vida, de vitória sobre as trevas e de força natural sobre a tribo. Esta conotação natural do sol será importante na compreensão do Natal como luz para o mundo. Nosso sol é Cristo. O Natal é seu despertar e o Advento a grande preparação para sua chegada.

sol

Em nossa tradição, a partir dos textos da Sagrada Escritura, os nossos primeiros “pais na fé”, bispos, presbíteros, monges e teólogos definem nossos dogmas e nossa liturgia. Aprendemos com eles a nossa tradição fundamental, acerca da doutrina, ética e liturgia e organização do cristianismo primitivo. Todos os primeiros concílios oficializam o conteúdo de nossas doutrinas e nossas tradições. Assim, também é definida a identidade e os dogmas do próprio Jesus Cristo. São elaborados e sistematizados ainda todos seus ensinamentos. A definição da dupla natureza de Jesus, numa única pessoa, dá-se no Concílio de Nicéia (325). Depois surgiram outras, entre elas o nosso maravilhoso Ano Litúrgico, que harmoniza as festas e os ritos de nossa celebração anual. Somos convidados a uma viagem com Deus durante todo este período, para que cresçamos na fé. É o convite para seguir o itinerário com Jesus Cristo.


CICLO LITÚRGICO PARA ACOLHER JESUS 

ano liturgico

Dentre os demais ciclos, o ciclo natalino tem por função nos adentrar nos mistérios da encarnação de Nosso Senhor. Diferente do Ciclo Pascal, que registra um dia específico para seu acontecimento, a Festa de Natal não tem datação histórica.

A Festa da Páscoa é a data da ressurreição de Jesus Cristo, que se deu no início da primavera. Sua festa é – no calendário judaico antigo – o 14º dia do mês de Nisan. Ocorre que hoje nós seguimos o calendário solar e é por isso que não coincide com a data fixa de nosso calendário civil.

Por sua vez, não temos a data exata do Nascimento de Jesus, pois Ele nasceu num lugar distante, numa estrebaria, e não era uma pessoa importante para o mundo político e civil.

A definição desta solenidade se refere à estação invernal. A datação está ligada ao dia mais curto do ano, chamado de solstício de inverno. Em todo Oriente, naquela região dominada pelos romanos, o dia mais curto do ano é 25 de dezembro. Ao mesmo tempo, na África, especialmente no Egito, o dia importante é 06 de janeiro. São os dias mais curtos do ano, onde parece que o sol morreu, de tanto que ele é distante daquela região, provocando dias muito curtos para noites muito longas.

 

Recordo uma família brasileira que mudou-se para um país distante, no hemisfério norte e as crianças perguntavam:

-Mãe, cadê o sol, o sol morreu?

Como os dias estavam muito curtos, amanhecia muito tarde e muito cedo anoitecia, as crianças tinham a impressão que o sol tinha perdido sua força, tinha morrido. Na verdade, ele estava mais distante, na data chamada solstício de inverno. Nesta data, o sol começa a ganhar espaço novamente. Surge o sol imperioso e os dias vão crescendo.

Esta é a lógica: o sol é Jesus Cristo. Ele nasceu e o mundo vai sendo invadido por sua luz. Esta é a datação propícia para celebrar o Natal.

Podemos aplicar esta simbologia para a demarcação da Festa do Natal.

É claro; estas datas simbolizam o fenômeno cósmico do sol que triunfa sobre as trevas e que traz a luz. Com esta luz, a vida que vai surgindo e aumentando a alegria de viver. Sendo estes dias os mais curtos do ano solar, paulatinamente os dias vão se alongando e encurtando as noites. Este fenômeno representa a luz de Deus que vai triunfando sobre as trevas do mundo. A criança que nasce é como o sol que desponta no horizonte e vai espantando as trevas do mundo.

Entendemos que as festas pagãs são celebrações inculturadas. O  “natalis solis invicti” (nascimento do sol invicto) representa o nascimento de Cristo. Ele é luz para o mundo e alegria dos povos. Celebramos assim, desde os tempos. Este período vai ser assumido pela Igreja primitiva como um “ritual de passagem”. É a passagem das trevas para a luz, do desencanto para a alegria. Todo este sentido espiritual é uma cerimônia cósmica e religiosa, para louvar a Deus pelo sol do mundo e pelo Cristo que é sol do universo.


PREPARAR A FESTA DO CÉU NA TERRA

Muitos dizem que o melhor de uma festa é a preparação desta festa. Esta festa de Natal tem sua preparação com as liturgias do Advento.

Recordemos o significado da palavra “advento”. Advendo significa  “que está para vir”

O tempo do Advento apresenta duas características:

Primeiro: tempo de preparação para as festividades de Natal. Este eleva o mistério da habitação divina no seio da humanidade.

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Segundo: tempo no qual, inspirada nesta lembrança, a comunidade cristã volta seu olhar e seu espírito para a manifestação escatológica de Cristo.

Por estas duas características, o Advento torna-se o tempo litúrgico que une a conversão histórica que deve mudar a nossa vida e a contemplação da nossa herança eterna, trazida por Jesus. É o grande presente de Deus para a humanidade. Deus nos entrega seu filho como dom para o mundo e Jesus nos oferta a vida eterna.

Encontramos neste período a piedade de conversão e a alegria da presença de Deus em nosso coração. São quatro semanas maravilhosas, importantes para nossa chegada ao Natal, para que esta grande festa não passe em vão ou seja apenas um evento social ou, pior ainda, apenas comercial. Falamos de um tempo de alegria e esperança, de conversão e de caminhada ao encontro do Senhor que “está para chegar”.

Vista-se de alegria, revista-se de caridade, inunde de fé seu coração, porque o filho de Deus está batendo às nossas portas.


ESPIRITUALIDADE DO CICLO DO ADVENTO

Estamos às portas do grande mistério da encarnação do Verbo Divino. Considerando este evento a partir de sua historicidade, procuramos entender o processo histórico deste grande mistério. Num momento da história, na plenitude dos tempos, Deus vivo e verdadeiro irrompe na vida da humanidade. Num ato supremo, Deus confirma sua Aliança, agora definitiva em Jesus Cristo. Se Deus está presente na história das coisas criadas (Sl 19), sua ação no mundo é plenificada na encarnação do Verbo (Gl 4, 4). Por esta ação, realiza-se o Reino de Deus. (Mc, 15). Pela presença de Cristo, o Reino torna-se realidade como uma semente lançada ao chão. Se a semente, já tem a vida da planta, quando lançada na terra, mas espera pela chuva para brotar, o Reino de Deus já está presente no mundo e espera a ação dos homens de boa vontade para florescer. Mas a semente do Reino já está fecundada, está no coração dos povos.

Esta é a dimensão escatológica, pois surge no horizonte de nossa história aquele que era, que é e que será o Deus verdadeiro. Falamos de um Deus sem tempo, num tempo presentificado. Nesta sua ação, Deus realiza a salvação plenamente e dinamiza nossa libertação.

Deus Emanuel, como repete Isaías, vem nos visitar e nos faz missionários. Assim, desabrocha a dimensão pascal do Advento e do Natal. Esta é a promessa e toda dedicação da raça humana para que o “deserto floresça”, os oprimidos sejam libertados, os maltratados sejam considerados nossos irmãos. É um tempo de realização da profecia, como encontramos em Lucas, narrando a presença de Jesus na sinagoga.

 

A ALEGRE ESPERANÇA DO ADVENTO 

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Para a Igreja, o Advento é semelhante a uma família que espera por um filho. É como um tempo de gravidez. Por esta metáfora, entendemos que nosso Deus se manifesta no Advento e coloca toda a humanidade em grande esperança. Falamos com o coração emocionado que esta é uma esperança alegre que reforça a luta pela vida, contra todos os sinais de morte. Se Deus está batendo às portas, e Ele o faz trazendo no espírito sua luz e sua alegria, acreditamos que a tristeza há de se acabar. Mais ainda, temos esperança que a escuridão da existência humana vai desaparecer. Tudo será luz. É um sonho, uma utopia, que se faz pouco a pouco e cada vez mais uma realidade.

Este é o tempo de edificar uma nova história, sob a inspiração divina. Os traços deste história são desenhadas na utopia da criança que nasce na gruta. E afinal, a gruta é nossa vida e seus sinais são a simplicidade, a solidariedade e o amor.

Os textos bíblicos revelam esta beleza sem fim. Toda esta alegria se manifesta nos anjos que vieram anunciar a chegada do Menino Deus: Glória a Deus nas alturas. (Lc, 1, 44). Desde os tempos antigos, estas promessas estão inscritas no coração do povo.

Elas já se despontam  nas profecias de Isaías (9, 2), no florescer do deserto ( Is 31, 1), no júbilo de toda a terra (Is 44, 23) e sobretudo na transformação do gênero humano, que libertará todo oprimido (Is 35, 9). Isaías é o grande anunciador deste acontecimento.

Outros personagens participam diretamente deste evento histórico. Recordamos João Batista, com Maria, tão exultantes de alegria. Eles são pequeninos, mas se tornam monumentos da exaltação da fragilidade humana contra as prepotências das nações.


TRANSFORMAÇÃO DA ALMA HUMANA

 A chegada do Menino, como um pobrezinho, numa gruta é um sinal de transformação de nossa vida. Toda alma humana é tocada por esta grande simplicidade. Ele se torna o templo  da esperança. Torna-se ação ativa e dinâmica na construção do Reino. O Rei, suavemente e com insistência, bate às portas da comunidade dos povos, todos os povos.

A transformação da alma promove a conversão para os valores do evangelho, entre tantos, a partilha dos bens com os mais pobres, a solidariedade com os miseráveis e a fraternidade universal. Os espinhos do mal devem ser queimados em nossas aldeias, em nossas estradas e em nossos corações. Deve ser banido de nosso coração o egoísmo que provoca riquezas às custas da exploração dos irmãos, os preconceitos que classifica os seres humanos, o fanatismo que nega a presença de Deus nas outras crenças e as falsas ideologias.

A espiritualidade este tempo gracioso aponta para a humildade de Deus. Ele, tão grandioso, infinito e poderoso, se faz simples e pequenino, numa manjedoura, numa estrebaria. Torna-se o maior ofertório de Deus para a humanidade e da humanidade para Deus. O Ciclo do Natal é um tempo litúrgico e eclesial para que possamos aprofundar nossa fé e nossa opção cristã. Somos mais que músicas natalinas, somos mais que confraternizações e muito mais que grandes decorações nas ruas. Tudo isso é tão bonito, mas são apenas sinais que somos visitados pelo Deus que veio nos iluminar, nos santificar e nos elevar.

A melhor gruta é nosso lar e a manjedoura mais preciosa é nosso coração.



Prof. João H. Hansen – Pe. Antônio S. Bogaz

autores de Vaticano II, novos tempos da liturgia cristã (Paulus 2015)

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ORIGEM DO ADVENTO

Os indícios do período de preparação ao Natal, chamado mais tarde de Advento, pode ser notado no século IV nas regiões europeias da Gália e da Espanha. Em Roma este período litúrgico entra, aos poucos, nas celebrações somente a partir da metade deste mesmo século, pois visava-se conservar a centralidade do mistério pascal e não fragilizá-la com o desenvolvimento de um segundo mistério da salvação, até então legado em segundo plano.
Santo Agostinho mostra que a celebração do Natal é uma simples “memória” e então o  Advento é a sua preparação, não apenas deste fato, mas, sobretudo, da manifestação escatológica de Jesus Cristo, como Senhor da história, no fim dos tempos.
Por sua vez, Leão Magno reflete o Natal como uma espécie de “sacramento”, o qual atualiza a presença de Jesus na história e apresenta o Advento como um tempo de preparação da humanidade para receber o seu Salvador e depois a sua segunda vinda como consequência da sua própria encarnação.
Mais tarde, com São Gregório de Tours, no século VI, este tempo é vivido com caráter penitencial, com jejum e abstinência. A cor litúrgica assumida nas celebrações passa a ser o roxo e origina a tradicional “quaresma de São Martinho”, pois após a festa deste santo, pratica-se o jejum até o Natal.
Desta evolução histórica, temos a tríplice dimensão do Advento, quer seja a histórica, que comemora a comunhão divina com a humanidade; a litúrgica, que valoriza a presença de Cristo na vida da Igreja, especialmente na eucaristia e, a escatológica, que desvela o senhorio de Jesus no mundo através de seu Reino até a consumação dos tempos.
 
(A.S.Bogaz. Natal, festa da luz e da alegria. Paulus. 2005)
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 CONHECENDO OS TEXTOS DAS CELEBRAÇÕES 

Todos os do tempo do Advento tem um formulário próprio de oração e isto confere a este tempo uma riqueza de conteúdo muito importante, sobretudo, porque existe um processo evolutivo nas temáticas litúrgicas, que vão desde a presença histórica de Jesus até sua  espera escatológica.
O tempo ferial se divide em duas partes significativas, quer sejam o período que vai até o dia 16 de dezembro, que celebra “aquele que é, que era e que está por vir” (Ap 1, 8) e o período do dia 17 ao 24 de dezembro que manifesta a teologia histórico-profética e expressa a preparação imediata ao Natal.
O primeiro período propõe uma preparação espiritual de “espera quase ansiosa”,  que se realizará, confirmando a nossa condição de filhos de Deus (1 Jo 3, 2), pois a encarnação de Jesus Cristo que se dará desvelará nossa condição humana (Col 3, 4).
A invocação de súplica presente no Apocalipse (22, 17. 20) brada ao Senhor que venha e que se manifeste à humanidade que espera.
Os dois personagens deste período, Isaías e João Batista, igualmente incisivos e de personalidades marcantes são, portanto, as duas bandeiras que sustentam as reflexões preparatórias para a segunda etapa do Advento.
O segundo período amplia a esperança dentro do seio da comunidade cristã, que vê perante seus olhos a manifestação plena de Deus.
Os textos bíblicos dos evangelhos de Mateus e Lucas proclamam os acontecimentos imediatamente anteriores ao nascimento do Salvador.
Os personagens deste período são Abraão, Davi, José, Zacarias, Isabel, João Batista e, especialmente, Maria, os quais retratam as relações humanas de Jesus.